Quantas âncoras cabem em um cotidiano?
passei um tempo sem aparecer por aqui, confesso. mas, aos poucos, fui aceitando que este espaço precisa ser livre de cobranças, um movimento que só faz sentido quando surge de forma natural. no último mês, dediquei minha energia nas entregas e leituras do mestrado durante as férias das aulas. agora que as aulas retornaram, minha rotina tende a ficar ainda mais agitada. mas, venho percebendo que mesmo com uma rotina corrida, sempre vão existir âncoras.
uma âncora pode ser descrita como "um dispositivo usado para conectar uma embarcação ao leito de um corpo d'água, evitando que ela se desvie devido ao vento ou correnteza." no entanto, quando falo sobre âncoras, não me refiro a grandes gestos ou acontecimentos, mas às pequenas coisas que compõem o cotidiano. gosto de pensar nelas como âncoras porque, em meio a compromissos, projetos, leituras e tarefas, são essas sutilezas do dia a dia que realmente fazem a diferença, que me mantêm conectada a mim mesma.
cheguei a essa palavra — que mais me parece um sentimento — quando me perguntei: por que gosto tanto de repetir certos "rituais"? ouvir as mesmas músicas? saborear os mesmos cafés, vinhos, comidas? para mim, essas repetições remetem ao afeto que permanece, muito mais do que às coisas em si. tive a confirmação disso quando me vi viciada em RedBull com gelo, algo experimentei no Lollapalooza deste ano, um momento que acabou sendo muito especial.
não pude deixar de me lembrar do filme Dias Perfeitos, onde somos imersos no cotidiano de Hirayama de uma maneira incrivelmente bela. somos capturados pela paixão dele por música, literatura e fotografia, e pela forma como o filme revela a beleza oculta nas rotinas. talvez sua coleção de fitacassetes seja para ele o que eu considero como minhas âncoras.
para mim, a beleza do cotidiano se revela em algumas (muitas) doses de café na minha ainda singela coleção de xícaras, em um momento de brincadeira com meus cachorros durante um dia de trabalho, em ouvir minhas músicas preferidas e cantar junto, ou em uma leitura não acadêmica que serve como um respiro da teoria, hoje inclusive ouso dizer que até mesmo o estudo da teoria pode servir como âncora em meio à rotina.
ainda sobre âncoras…
um dossiê que ninguém pediu: outras coisas & links
todos os documentários sobre natureza e tubarões que assisti recentemente pelo National Geographic
o álbum que mais ouvi na minha vida, Currents de Tame Impala.
um dos últimos filmes que vi de uma diretora que tem me atravessado muito, Cléo das 5 às 7 de Agnès Varda
um dos meus livros preferidos da minha autora preferida, Dias de abandono de Elena Ferrante
um dos últimos livros que li da Annie e que se tornou um dos preferidos, A outra filha de Annie Ernaux